Vamos contemplar a vide
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Vamos contemplar a vide, Sua vida aprender: Cresce em meio a sofrimentos, Rispidez a padecer. Não quais flores que, selvagens, Crescem sem limitação; Mas em dédalo confuso, Contorcida, em restrição. |
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Mas as flores da videira Não têm glória, ostentação; Mesmo com certa aparência, Raramente vistas são. Certo dia, já floridas, Frutos tornam-se também; Nunca ostentam as corolas Luxo ou primor, porém. |
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Amarrada a um esteio, Livre, já não crescerá; Quando estende a ramagem, À treliça se atará. Em terreno pedregoso, Dele tira seu suprir; Nunca escolhe seu caminho Nem de apuros vai fugir. |
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Oh! quão belo é seu verde, Que na primavera há; É da vida a energia Que o crescimento dá. Té ser cheia de raminhos Que se torcem cá e lá, Sob o céu azul se estendem, Provam docemente o ar. |
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Mas o mestre da videira Sem clemência logo vem, Despe com tesoura ou faca A roupagem que ela tem. Não se importa se é tenra, Golpes dá com precisão; E os ramos excessivos, Já na vide não estão. |
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Nessa hora de ruína, Ousa ter de si pesar? Antes, ao que assim a fere, Totalmente, pois, se dá. A mão que lhe despe os ramos, Tira seu primor sem par, Para que não gaste a vida E, sim, para frutos dar. |
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Cada broto mutilado, Antes tenro, endureceu; Cada ramo aí deixado Muitos cachos forneceu. Então sob o sol ardente, Cada folha seca e cai, E os frutos, té a ceifa, Madurecem mais e mais. |
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Galhos curvam-se de frutos Que os fazem descender; É o labor do crescimento Mediante seu sofrer. Com os frutos já maduros, Consolada a vide está? Não. A messe se aproxima, Tal consolo fugirá. |
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Mãos apanham, pés esmagam A riqueza que ela deu; Té que do lagar provenha O fluir do vinho seu. Dia a dia, flui contínuo, Rubro, puro ao paladar; Jorra livre, doce, rico, Para a todos alegrar. |
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No aspecto, a videira, Nua, pobre, só, ali, Tendo entregado tudo, Em silêncio vai dormir. Quem irá recompensá-la Pelo vinho que proveu? Antes, mais podada ainda, Se reduz ao tronco seu. |
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O seu vinho no inverno É mui doce, traz calor Aos que tremem, passam frio, São premidos pela dor. Mas lá fora, só, a vide Entre neve e gelo está; Firme, seu quinhão suporta, É difícil decifrar. |
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Foi-se o frio, vai a vide Novamente produzir; Com renovos já brotando, Verde volta a vestir. Não murmura, não reclama Do abuso invernal, Nem reduz a sua oferta Por sofrer tamanho mal. |
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Respirando o ar celeste Alto os braços vai alçar; Impurezas desta terra Não a vão contaminar. Com sorriso logo enfrenta Nova poda do amor, Como se jamais sofrera Perda, restrição ou dor. |
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Flui dos ramos da videira Seiva, sangue, vinho seu; Ficará mais fraca ou pobre Com as perdas que sofreu? Bebedores, andarilhos, Seu prazer da vide vem; Mas vão acordar mais ricos Pelo gozo que eles têm? |
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Não por lucro, mas por perda É medida a vida aqui; Não por vinho que bebemos, Pelo que vertemos, sim. Pois nos nossos sacrifícios Firma-se o poder do amor; Compartilha mais com outros Quem sofreu lesão maior. |
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Quem consigo é mais severo, Pode mais a Deus ganhar; Quem se fere e paga o preço, Pode outros consolar. Quem dos sofrimentos foge É qual "bronze a soar"; Quem não poupa a própriavida, Tem o gozo que é sem par. |
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